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Duas Bloggers, Duas Histórias, Uma Doença : A Anorexia.

Duas bloggers, irmãs na doença, juntaram-se num só blog para contarem as suas vitórias. O nosso objectivo será sempre ajudar (se possível) quem esteja a passar por esta doença... a anorexia!

Por dentro da cabeça de uma anorética...

Ao longo deste blog, contamos as nossas histórias e partilhamos alguns relatos assim como artigos sobre anorexia. Mas, acho que nos faltou um pouco do chamado "nu e cru" das recaídas. (Sim, elas podem existir!)

Pois bem, o que sente uma pessoa com anorexia? Nem ela sabe! É um medo de não corresponder a "padrões", é uma falta de visão real sobre o seu próprio corpo, é o odiar-se a si mesma!  

"Ai, Vânia. Que exagero!" 

Infelizmente, não o é. Não vemos o que vocês vêem...

Há uns dias inclusive, mandei mensagem à minha irmã, psicóloga e que viveu estas fases com uma anoréctica.

Estive a rever fotos de uma recaída que tive há pouquíssimo tempo atrás (aproximadamente 4/5 anos). E, eu mesma, estava abismada com o meu corpo. Isto porque, eu NUNCA me vi assim naquela altura. Vocês imaginem alguém modificar uma foto vossa e diminuir/aumentar o vosso peso. É algo que nunca viram e estão a ver pela primeira vez. Foi exactamente isso que senti. 

Sempre soube que a nossa noção da realidade corporal era complicada. Que não tínhamos uma ideia -ao certo- de como somos. Mas, este choque de realidade (porque já se tinham passado uns anos) assustou-me. Até porque não tenho fotos da minha "pior fase" e, acho que nem quereria. Mas penso, como será então que estava se, numa pequena recaída, fiquei chocada?! É um sentimento confuso. Como que vivendo uma realidade paralela à nossa. Eu sei que sou eu. Mas não pareço eu e não sinto que sou eu. (Não sei se me estou a fazer entender). Sei que passei por essa fase, mas não faço ideia do que foi. Conseguem perceber a confusão? Basicamente, vivi algo, não me recordo de muito e sinto que parte nem fui eu que vivi. 

Ainda hoje, não tenho uma relação com a balança nem com o espelho. Até porque, não me adianta de nada! Anos se passaram e creio que nunca me verei magra mesmo que o esteja.

Hoje em dia estou "bem" e até preciso de perder uns kgs mas sei que, mesmo que estivesse "magrérrima" e numa dessas fases, iria pensar o mesmo.

Complemento-me com o exercício pois sei que a alimentação sempre será um 8 e um 80. Criei manhas dentro da minha própria cabeça para não me deixar ir... e é isto. 

Mas, este é o meu caso... 

E continuo a dizer que me preocupa imenso os jovens e esta nova fase das redes sociais de falta de filtros em que tudo é dito sem empatia, onde tudo é partilhado sem responsabilidade social ... 

"Tudo, Aqui e agora" da Netflix

Ultimamente, tenho-me debatido -novamente- com o meu peso. Sim, tenho quase 36 anos e ainda ando numa inconstância entre "Estás bem" e o "Tens de emagrecer".  Creio que é algo natural de quem passou anos com distúrbio alimentar. 

Adiante... 

Por norma, nas minhas horas de almoço -em tempos de chuva- coloco um filme ou série e vou vendo ao longo do meu pouco tempo livre. Acabei então de ver uma série de comédia e, automaticamente, passou para uma drama que me despertou a curiosidade. Ora, como eu não acredito muito em coincidências, creio que veio na altura certa. 

Esta série britânica de comédia dramática adolescente é sobre a Mia, o seu internamento e a sua recuperação de um distúrbio alimentar. Achei interessante, independentemente da idade. Aliás, acho importante existirem "abre olhos" assim, nus e crus.

Aconselho a pais e a filhos, principalmente! 

E não, não é baseada em uma história verídica, mas creio ser inspirada em várias histórias reais. É uma série que não se baseia apenas em uma adolescente doente e é extremamente rica em informação, em nada exagerada. 

"Tudo, Aqui e agora" da Netflix

Ultimamente, tenho-me debatido -novamente- com o meu peso. Sim, tenho quase 36 anos e ainda ando numa inconstância entre "Estás bem" e o "Tens de emagrecer".  Creio que é algo natural de quem passou anos com distúrbio alimentar. 

Adiante... 

Por norma, nas minhas horas de almoço -em tempos de chuva- coloco um filme ou série e vou vendo ao longo do meu pouco tempo livre. Acabei então de ver uma série de comédia e, automaticamente, passou para uma drama que me despertou a curiosidade. Ora, como eu não acredito muito em coincidências, creio que veio na altura certa. 

Esta série britânica de comédia dramática adolescente é sobre a Mia, o seu internamento e a sua recuperação de um distúrbio alimentar. Achei interessante, independentemente da idade. Aliás, acho importante existirem "abre olhos" assim, nus e crus.

Aconselho a pais e a filhos, principalmente! 

E não, não é baseada em uma história verídica, mas creio ser inspirada em várias histórias reais. É uma série que não se baseia apenas em uma adolescente doente e é extremamente rica em informação, em nada exagerada. 

Vejam.

E, se tens uma visão errada sobre o teu corpo, se não consegues ter uma informação real no espelho, não tenhas vergonha de pedir ajuda. Pode salvar a tua vida e até de quem te rodeia. 

a tal da Liberdade de Expressão...

Relativamente aos meus últimos "posts" , recebi mensagens e comentários do mesmo teor. Ou seja, a "informar-me" de que só está nas redes sociais quem quer.

Verdade, claro que é verdade.

Mas, mais uma vez, "a liberdade de um acaba quando começa a do outro". E acho que muita gente não entende isso e acha que é de seu direito comentar sobre o aspecto físico (ou o que seja!) da outra pessoa. 

Então vejamos... Um jovem (ou até adulto!) tem redes sociais para conviver, passar tempo, divertir-se... Ao fim e ao cabo, é para isso mesmo que as temos! Do nada, publica uma fotografia/vídeo. Recebe comentários sobre o seu peso, a sua mancha no rosto, as suas borbulhas, etc. A moça bonitona coloca uma foto. É chamada de p**a, v*c*, oferecid*, etc. Uma pessoa expõe a sua sexualidade. Lê um monte de comentários preconceituosos... (Entre outras situações que, infelizmente, existem!)

A pessoa lê tudo. A auto-estima que tem (se é que a tinha) vai ao fundo. Fica depressiva (se é que já não o era). Entra numa espiral de negrume, paranóia, baixa auto-estima, desacreditação, etc. Atenta contra o seu bem mais precioso. As pessoas que fizeram os tais comentários, seguem a sua vida. Não foi nada com elas.

Para elas, não têm culpa de nada. O outro é que é fraco. Mas têm ! Todos somos culpados pelos NOSSOS actos. E, referir algo negativo que irá afectar a outra pessoa é um acto egoísta nosso.

"Mas a pessoa não a m*tou". Não. Apenas contribuiu para que o outro se sentisse pior e fizesse algo.  

Em Setembro, grande parte dessas pessoas vestem as suas redes sociais de amarelo. Afinal de contas, a culpa nunca é delas e ser "solidário" está na moda. 

PS.: Vocês sabem que custa menos energia e demora o mesmo tempo fazer um comentário positivo ao invés de um negativo?!

(e pode ajudar tanto uma pessoa...)

 

"Ai que drama, Vânia!"

Não.

Não é drama.

É realidade nua e crua!

É preciso falar!

"Hospitalizações por anorexia dispararam nos últimos cinco anos.

Faltam camas para o tratamento e as agendas das consultas estão cheias.

Especialistas apontam uma maior “predisposição social” para a doença"

Expresso, Abril 2023

 

"Os efeitos prejudiciais da pandemia de Covid-19 e os períodos de bloqueio na saúde mental continuam a ser sentidos em todo o espectro.

 A prevalência de distúrbios alimentares e alimentares (FEDs) como anorexia nervosa, bulimia e compulsão alimentar aumentou acentuadamente desde 2019, de acordo com várias publicações internacionais."

Le Monde, Agosto 2023

                                                                                         Gráfico https://www.nbcnews.com/

 

O culto do corpo é, cada vez mais, visível na nossa sociedade.

Cada vez mais os miúdos necessitam do "corpo perfeito".

Na minha opinião, também acontece pois, hoje em dia, as redes sociais tomaram conta da vida das pessoas e os adolescentes são muito mais "fortes" atrás de um telemóvel. O vicio das visualizações, os "ídolos", as "perfeições" que existem nas redes sociais estão a um ecrã de nós, a segundos de acesso. Na minha altura, era somente nas revistas (as que tínhamos de ir comprar lá àpapelaria da vila) e na televisão. E isto era em muito menos escala do que agora! 

Hoje existem "influenciadores" com pouca responsabilidade social que acabam por ajudar a destruir auto-estimas e a incentivar á busca da "perfeição".

Hoje em dia, comenta-se que a pessoa é feia, gorda, flácida, com estrias, sem sequer se importar com as consequências que tal comentário irá trazer para essa mesma pessoa! É tudo questão de segundos que irá destruir alguém durante anos ou até a vida inteira.

O bullying , actualmente, foi facilitado. 

O Covid não ajudou. 

E, onde está a consciencialização?  E, onde está a consequência de quem pratica actos contra os outros? 

Não se fala sobre isso. Não se pune quem ataca os outros e destrói vidas. 

Não, não é um esfaqueamento fisico. Mas é um esfaqueamento mental com mais uns tiros na auto-estima da pessoa! E terá sequelas para toda a vida...

É preciso fazer algo antes que se percam mais vidas.

Antes que a sociedade adoeça ainda mais... 

 

 

Antigamente vs Agora - a anorexia

Olá gente.

Estou a tentar manter um bocadinho o nosso blog, ao mesmo tempo que tento informar um bocado. O problema, é que tenho somente o meu lado, as minhas vivências, e cada caso é um caso. O meu não foi igual ao da Catarina. O da Catarina não foi igual ao da Ana. O da Ana não foi semelhante ao da Beatriz... Ou seja, tudo o que escrevo, é do meu caso, embora tente também manter um bocado a parte que conheço da doença e de alguns casos que presenciei ou dos quais tive conhecimento. Hoje, venho tentar falar sobre o "Antigamente vs Agora"

Relativamente ás ideias que se tinham antigamente sobre a doença, hoje em dia as informações são muito mais vastas. O que é bom e mau ao mesmo tempo. Se, por um lado, sabemos mais sobre a doença, por outro lado, acredito que há muito mais informações em como se pode esconder e mais meios de se tornar uma obsessão maior. 

Fui vitima da doença há 15 anos atrás, com algumas recaídas pelo meio. O que é certo é que, naquela altura, apenas existiam revistas e pouco uso de internet... Apenas deixei de comer e pronto. Actualmente existem "contadores de calorias", redes sociais com constantes modelos magras, estereotipadas, etc e também muitos chicos-espertos atrás de um teclado . Psicologicamente, eu estava de rastos e nem tinha nada disto. Não me imagino passar pela doença com um contador de calorias no telemóvel, modelos magras e maravilhosas nos meus "feeds" e gente maldosa a comentar as minhas coisas ou até de outras pessoas e que me fizessem sentir pior comigo mesma. Talvez tivesse acabado comigo! Talvez não estivesse agora a escrever isto...

A sociedade está mais informada? está! Para ambos os lados...

Antigamente existia anorexia, hoje existe anorexia e, de futuro, irá existir anorexia. Mas confesso que me preocupa o estado psicológico de quem passa por ela agora e a "força" que ela poderá ter na vida de alguém. As pessoas são tão maldosas, tão egoístas... e nós conseguimos ser tão auto-destrutivos!

Anorexia... Porquê?

Ora, certamente não terá sido porque um belo dia de manhã acordamos e pensamos "E hoje que me estava a apetecer tanto padecer de uma anorexia nervosa..."  Nem tão pouco é porque nos deitamos a rezar a Deus Nosso Senhor por uma anorexiazinha como dádiva! E não, também não a pedimos ao menino Jesus nem ao Pai Natal. 

 

 

Jamais poderei falar por todos os doentes de distúrbios alimentares, cada caso é um caso e cada um sabe onde lhe aperta o sapato (sapatilha, bota, sabrina, wathever...). A verdade é que existem sempre algumas coisas com as quais nos identificamos uns com os outros. Em todos, existe uma péssima relação com a comida (oh, really?!) e, no caso da anorexia, uma visão errada relativamente ao corpo. Muitas das vezes, nós olhamos ao espelho e vemos uma realidade diferente da que uma pessoa sem anorexia verá... Nós NUNCA nos vemos magras, lindas e maravilhosas! Por muito magras que estejamos, conseguimos sempre encontrar banhas em algum lado (elas podem nem existir, mas nós vemos!)

E reforço, não é uma dieta! Muito pelo contrário, é uma ausência cada vez maior de alimentos. E, apesar de ser mais comum em pessoas do sexo feminino, não é uma doença somente nossa!  Aliás, tendo em conta as redes sociais e a busca pelo corpo perfeito, acho que cada vez mais os adolescentes irão sofrer de distúrbios alimentares independentemente do sexo. Até porque os miúdos são cada vez mais maldosos até na internet (miúdos e gente grande a ser parva, também!) e aproveitam que são os melhores do mundo atrás de um telemóvel ou de um pc...  (isto sou eu a escrever e não nenhum cientista... Pensamentos meus!) 

 

 

Prever? Não se prevê. Os pais ainda não são o Bruxo de Fafe nem a Maya para preverem um distúrbio num filho... Mas acho que têm de estar atentos ás redes sociais dos filhos (o bullying muitas vezes contribui para uma baixa auto-estima e para um desequilibro da pessoa) e ver a malta em casa, como andam, o que comem, etc.

Como ajudar? Não desvalorizar, não culpar a pessoa, não serem imbecis, apoiarem, incentivarem, elogiarem, acarinharem... e, fazer com que vá ao médico, de mansinho, como fazemos quando queremos levar uma criança ao dentista! E tentem perceber em que fase a pessoa está em termos psicológicos... acima de tudo isso. 

 

Beijinhos e abraços destes ossinhos agora com gordurinhas, marcado com estrias e celulite... 

Chegar á idade adulta e ter um passado com anorexia...

Quem teve\tem anorexia, vai entender o que digo quando falo que me irrita o olhar chocado das pessoas quando descobrem que sofri\sofro de anorexia. Nem eu mesma sei explicar certas coisas e tive\tenho a doença. A verdade é que, há 15 anos atrás, a informação sobre a anorexia era pouca (eu nem sabia que existia tal coisa até ao diagnóstico -confesso) e hoje é um assunto que vem por modas, ou seja, parte das pessoas que divulgam informação sobre isso, é somente para dar conhecimento de que famosa\o "X" tem um distúrbio alimentar. 

Quando ouço determinadas baboseiras, revelo o meu passado. Com vergonha e receio, mas revelo! Creio até que foi para isso que nós criamos este blog - para dar mais informação na primeira pessoa. 

Felizmente, ainda há quem não se esqueça de que é real, é uma doença e é uma incógnita para muitos, ainda. Os mais desinformados, continuam a achar que é uma "mania das dietas" e que só tem quem quer e quem não tem cabeça (ouvi isto tantas vezes!). 

Actualmente tenho 32 anos. Tive uma anorexia na adolescência. Tive 2 recaídas leves. Consegui ser mais forte do que a doença. Achei que estava curada até começar a ter uma recaída, aos 29 anos (creio que foi nessa idade) e entrar em outra o ano passado. Achava que tinha tido anorexia e que ela ficava no passado. Nunca me preocupei se iria recair porque achava que, uma vez curada, esse fantasma não me iria assombrar mais... Enganei-me! 

Hoje, olho para o passado e vejo-a como uma pedra no caminho que me é atirada de vez em quando. Cabe a mim voltar a tirá-la do meu caminho e ter força para tal. Até porque a principal medicação contra a malvada, é a nossa força de vontade. Acabamos por descobrir artimanhas para a enganar. Eu uso o desporto. 

Com isto da pandemia a minha alimentação é horrivel, mas compenso com corridas. 

E pronto... É assim que tenho vivido com o meu fantasma. Mandando-o dar uma curva quando se lembra de aparecer! 

 

Um Ano Feliz,

Vânia

Recaidas...

Olá gente boa. 

Andamos desaparecidas aqui do blog - eu,Vânia, ando desaparecida dos blogs em geral- mas senti necessidade de vir escrever por aqui. Tinha sentido. Precisava.

Bem, sempre tive medo de me deixar cair outra vez mas, pensava eu, não seria fácil. Achamos que , se superamos uma vez e que, se tivemos força para lutar contra ela, não nos deixaremos cair (afinal de contas a maldita faz parte do passado -pensamos!). Eu deixei. Quase caí fundo... Foi uma mistura de stress no trabalho, muitas horas laborais e o término de uma relação. O cansaço psicológico achou que estava na altura de aparecer e a sacana também. Não fui á médica. Recusei-me a aceitar que estava outra vez a entrar de onde tanto me custou a sair. Emagreci novamente bastante. E dei a desculpa a toda a gente que teria sido efeitos de uma colonoscopia. Que o meu organismo não gostou da preparação do exame nem do pós (o que não deixou de ser verdade pois andei uma semana a comer muito mal). 

Passei a vestir o 36. Coisa que nem sabia o que era há 15 anos. Tive de comprar calças. Até as minhas leggins me ficavam largas. 

Cheguei aos 54\55kgs... Não sei ao certo pois desisti de me pesar.

Não comia. Não conseguia! Não tinha apetite. Não tinha vontade. Não me apetecia sequer. Não me via magra mesmo ouvindo isso de toda a gente umas 20 vezes ao dia. Por alguma razão eu NUNCA me vejo magra. Não vos sei explicar ao certo, olho-me ao espelho e não vejo magreza, esteja com o peso que estiver. 

Felizmente, não precisei de cair mais. Ouvir todos os dias o mesmo mexeu-me com a cabeça. Não fui sequer a uma consulta! Andei a fugir da médica 2 meses até ganhar peso...

Sabem o que me motivou a voltar a comer? Desporto. Comecei a correr, a ir ao ginásio, voltei á piscina... e a fome voltou! 

Mais uma vez, comprovei que esta filha da mãe aparece quando a cabeça fraqueja e só vai quando a cabeça se lembra de ganhar força. Temos de ser nós. Por nós! 

 

Como identificar e lidar com a anorexia

Todos sabemos (se não,devíamos) que os distúrbios alimentares são problemas sérios e que afectam as mais variadas pessoas, das mais variadas idades e sexos. O que muitos de nós desconhece é que afecta muito mais pessoas do que se pensa e que ainda há muita gente a morrer desta doença. Sabiam que dos 15 aos 24 anos a anorexia mata 12 vezes mais do que qualquer outra doença? E que, em 20% dos casos de anorécticos existe uma morte prematura?

Muitas das vezes pensamos que, pelo facto de não ser algo que nos calhe a nós, devemos manter-nos ignorantes relativamente ao assunto. Mas, garantimos-vos de que pode acontecer em qualquer família. Aconteceu nas nossas sem que nenhum deles esperasse! Pode acontecer com alguém da sua família, com algum dos seus amigos ou conhecidos. Qual a melhor forma então de ajudar? Observando e cuidando. Como? É isso que iremos mostrar. Claro que CADA CASO É UM CASO. E os nossos foram tão distintos mas tão iguais que vamos dar-vos algumas dicas que achamos mais importantes.

                          (imagem retirada daqui)

 

Como já sabem, a anorexia é uma restrição alimentar que vem de uma visão distorcida da realidade sobre o seu próprio corpo e um medo constante e intenso de engordar. Muitas vezes é fruto de problemas sociais e\ou pessoais e pode matar ou marcar a pessoa para a vida. Então, vamos ajudar?

 

O passo principal é OBSERVAR. Uma pessoa anoréctica não irá chegar ao pé de si dizendo estar com um problema de anorexia. Você, provavelmente, conseguirá ver, observando atentamente. (Se não conseguir, não se culpe pois uma pessoa anoréctica torna-se profissional na arte de ocultar e mentir - falamos por experiência!)

Observe o comportamento alimentar, a obsessão com o corpo, as diminuições de peso, a aparência física e as mais variadas desculpas para não comer. 

A pessoa anoréctica tem uma relação com a comida que pode levar a mastigar excessivamente. medir alimentos, contar calorias, pesquisar sobre os produtos, etc. Terá também uma obsessão com o seu corpo que irá fazer com que se veja gorda mesmo não estando. Irá pesar-se repetidas vezes e demorará tempos infinitos na casa de banho (outras têm aversão ao espelho e á balança). Estas pessoas baixam drasticamente de peso e camuflam isso com roupas largas que irá fazer com que passe um pouco despercebido a quem as rodeia. Utilizarão desculpas para não comer ou comer pouco ("Estou doente", "Não tenho fome", "Não gosto da comida",etc) mesmo que estejam em algum evento social. O facto de comerem irá proporcionar-lhes culpa e vergonha. 

Como tal, a pessoa anoréctica irá andar fraca, com tonturas, unhas e cabelos quebradiços, pele ressecada e pálida,  olhos amarelados, etc. Em termos emocionais também irá ver mudanças pois, devido à falta de nutrientes, o seu corpo estará desregulado e estão mais sujeitas a depressões e ansiedade. Irá notar a pessoa com mais irritabilidade, indiferença,dificuldade em concentrar, por exemplo. 

 

A pessoa anoréctica é alguém com baixa auto-estima, pelo que ouvirá muitas vezes dizer que não vale nada, que não faz nada bem, que não é suficientemente boa. Como tal, existe também um afastamento dos amigos, familiares e até das suas actividades habituais. 

 

          (imagem retirada daqui)

 

COMO AJUDAR?

Acima de tudo, NUNCA critique, NUNCA culpe, não grite, não faça ameaças, não desmoralize. Opte pelo positivismo, por comemorar cada etapa bem sucedida, por perguntar à pessoa pelos seus sentimentos, por mostrar que se importa e que gosta dela

Essas coisas de "ah. Vais morrer se não te cuidares" não resulta e a pessoa ficará mais stressada. Não o façam! Mostrem-lhe carinho, amor, compreensão

 

Muitas vezes, há quem diga que, se fossemos filhas delas, tinham tido pulso firme ou tal nunca teria acontecido (quantas vezes já o ouvimos?). Minha gente, garantimos-vos de que isso é TRETA! O chamado "pulso firme" não ajuda, apenas provoca mais raiva e revolta. E o "nunca teria acontecido" é pura ignorância relativamente à doença. Abram as mentes e pensem que pode acontecer até consigo, com a sua filha, com a sua irmã (estamos a falar no feminino mas existe também o lado masculino). 

 

Ajudem. Comecem por se informarem.

 

Beijinhos de duas pessoas que não queriam ter tido "pulsos firmes" nas suas doenças. 

 

Vocês perguntam. Nós respondemos # 6

Temos andado um pouco desaparecidas mas tudo por bons motivos. No entanto ainda existem perguntas por responder e não vamos descansar enquanto não as respondermos a todas.

Nesta rubrica vamos responder à pergunta que nos foi colocada pela Filipa Iria.

 

P: Eu gostava de saber como é que lidam nos dias de hoje com a alimentação depois de terem ultrapassado uma doença como a anorexia (se é que se ultrapassa completamente..) 

 

Catarina: No meu caso a normalização alimentar não foi assim muito rápida. Durante anos apenas comi peixe e carnes brancas, legumes, saladas e fruta. Evitava doces ao máximo embora como sou gulosa acabava por cair na tentação algumas vezes. Não comia enchidos, grão, feijão, carnes vermelhas, fritos, guisados,etc. Com o passar dos anos foi começando a relaxar a nível de alimentação e comecei a experimentar coisas novas. Hoje em dia como praticamente tudo, digo praticamente tudo porque existem coisas que de facto não gosto como é o caso do borrego e cabrito. O importante é que provo tudo e depois decido se gosto ou não afinal nem todos podemos gostar de tudo.

Vânia: Eu costumo dizer que fui do 8 ao 80! Até 2010, mais ou menos, a minha alimentação era de quando o rei fazia anos... quando voltei a ingerir comida -e não maçãs- comia de vez em quando, até porque fiquei com problemas de estômago e por isso tive de fazer tratamentos e tenho uma medicação para a vida. Só a partir de 2010, estando já medicada e normalizada, comecei a ganhar o gosto pela cozinha e, aos poucos, pela comida (até porque o meu estômago já me deixava comer sem deitar tudo fora). Comecei a gostar de coisas das quais nunca tinha gostado!  Comecei a comer de tudo. Os meus amigos costumam chamar-me a atenção pelas porcarias que como (chocolates, batatas fritas, doces, etc) e é o que costumo dizer ''privei-me tanto tempo da comida que agora não me privo de nada''.  Sim, eu sei que também não se faz!

O blog também foi à Sic... com a Catarina!

 Há umas semanas fomos contactadas pela Patrícia, da Sic, para participarmos num programa chamado "A Vida nas Cartas - O Dilema" com as nossas histórias e o nosso pequeno projecto. Porém, sendo eu de longe, não me pude deslocar até perto da nossa Catarina e disse-lhe que confiava nela para contar a sua história e falar sobre o nosso blog. Sem dúvida alguma que a nossa menina é uma óptima oradora e não poderia representar melhor este cantinho! Eu mesma não faria melhor nem sequer igual... (A sério, ela esteve mesmo bem, não esteve?)

O tempo de reportagem é curtinho, a sua história foi resumida ao máximo e conseguiu até falar sobre o " Duas Bloggers, Duas Histórias, Uma Doença : A Anorexia." Como foi falado pouquinho do seu trajecto, se quiserem conhecer melhor a história da nossa menina, basta carregarem em cima do nome da Catarina lá em cima. Assim conseguirão acompanhar toda a sua luta contra esta doença. 

Sem título (2).jpg

 Euzinha, que sou uma medricas nestas coisas, só tenho de agradecer a esta irmã que a doença me deu, por dar a sua voz, a cara (e eu sei que ela estava nervosa!), tempo e dedicação e ainda por partilhar a sua história connosco. Sinto-me extremamente orgulhosa desta mulher guerreira que, mesmo com tão pouco tempo pessoal disponível, ainda o perde a ajudar. E tenho de lhe agradecer por toda a dedicação a este projecto e por todo o carinho... Obrigada minha irmã!  Por teres até a coragem que eu não tenho...  E sei que desta vez te custou mais um bocadinho mas ficaste tão bem e representaste-nos tão bem!

 

Aproveito para agradecer todo o apoio que temos tido e todas as ajudas que já nos deram. Obviamente que não é só um projecto nosso, é de todos! Agradeço imenso. 

 

V*

 

O que é a anorexia nervosa?

Como já dissemos anteriormente, a anorexia nervosa não é uma decisão de vida. Nós não acordámos um dia, pela manhãzinha, e pensámos "Hoje sabia-me mesmo bem uma anorexia nervosa!". Não! Não foi uma escolha. Embora exista uma espécie de "decisão" em começar dietas, abstenções e coisas do género, é algo que provém de uma mente que está com um problema e que necessita, urgentemente, de ajuda.

É isso que queremos desmistificar aqui! Ao longo da vida, já fomos culpabilizadas como se tivesse sido algo pelo qual escolhemos passar. Como se fosse engraçado olharmos-nos no espelho e odiarmos o que vemos. Como se nós tivéssemos achado piada à azafama de médicos e hospitais, agulhas, vitaminas, etc. As coisas não são bem assim... 

 

E então, o que é mesmo a anorexia nervosa?

  • anorexia de origem grega = (a\an-negação) e (orégo-apetecer), negação do desejo por comer,do apetite. 

A anorexia nervosa é uma doença. Ponto! É uma perturbação no nosso comportamento alimentar que afecta, na sua grande maioria, mulheres jovens que tentam ter um controlo extremo no seu peso corporal, através de uma enorme restrição na alimentação. 

 Muitas das  vezes, a anorexia provém do facto das mulheres se sentirem infelizes com o seu  corpo mas, não advém somente desse aspecto. A infelicidade, a nível social, poderá igualmente desencadear a doença. A rejeição da sociedade, dos seus pares, a difamação, bullying, qualquer tipo de ofensas e\ou agressões, poderão levar ao desencadeamento da doença... (E, deixem-nos que vos pergunte: a culpa continua a ser da doente ?) 

 As angustias, os relacionamentos sociais falhos, a depressão, problemas familiares, a visão utópica de um "corpo perfeito" poderão igualmente levar a uma baixa auto-estima e, consequentemente, à doença. 

Uma vitima de anorexia pensará que, se for magra, os seus problemas serão dissipados e serão mais felizes. É uma luta desenfreada pela tentativa de alcançar aquele que julgamos ser o "corpo ideal". Mas, o problema é que, embora emagrecendo, a pessoa doente, não se verá magra e continuará infeliz. 

 

E a família? 

Vamos ser honestos, algumas das pessoas que percebe que a doença é isso mesmo (uma doença!) acaba por culpabilizar a família. Vamos então explicar-vos o nosso lado... 

Nós, doentes, tornamos-nos peritas na mentira e omissão! Conseguimos das mais variadas formas contornar diversas situações para que não percebam o que se está a passar. E agora é a parte em que nos dizem "Ah. Mas então vocês sabiam o que estavam a fazer". Sim e não! Pensávamos que o que estávamos a fazer nos iria ajudar mas que a família jamais iria compreender e iria tentar impedir isso de alguma forma. Por isso, por muito que nem tenhamos jeito para mentir, a mentira torna-se a nossa melhor arte. 

Além disso, a família é uma das partes mais importantes para a nossa recuperação. A grande maioria das vezes, são mesmo a salvação!

 

 

(imagem retirada de A anorexia tirou-lhe dez centímetros de altura. E muito mais.-Expresso)

 

Segundo dados da Direcção-Geral de Saúde (DGS),  os hospitais do nosso país contabilizaram 727 internamentos entre os anos 2010 e 2014, sendo, maioritariamente, pessoas do sexo feminino entre os 18 e os 39 anos de idade, seguidas de adolescentes até aos 17 anos. No que diz respeito ao sexo masculino, atinge, em maior número, jovens até aos 17 anos de idade.

 

 

E isto, é um pouco do que é a norexia nervosa. Não somos especialistas para falar a nivel médico, mas explicamos por palavras nossas pelo que passámos. Esperamos que compreendam e que, se tiverem algumas dúvidas, nos perguntem pois estamos cá para isso mesmo, para ajudar.

A ignorância da falta de informação

''Tiveste anorexia porque quiseste''

Se há coisa que me irrita e me deixa fula da vida, é quando ouço uma coisa destas! E, provém muitas vezes de pessoas que me eram chegadas na altura...
''Ah. Naquela altura em que tinhas as manias das dietas?'' 
Qual a parte que as pessoas não percebem de que não é uma dieta e muito menos é uma mania?!
Como é possível ainda existir tanta falta de informação e de sensibilidade ?! Vocês não imaginam o possessa que fico quando ouço destas pérolas! E sim, ouço-as mais vezes do que imaginaria...
Foi, por coisas destas, que eu e a Catarina tentamos  desmistificar um pouco essa doença.  Porque ouvir estas coisas, magoa. A serio, magoa mesmo! Parece que nos culpam por termos estado doentes. Que somos nós as culpadas por ela existir.
EU NÃO TIVE  ANOREXIA PORQUE QUIS. EU NÃO ESTIVE DE DIETA! 
Vocês pensem bem quando falam...imaginem que um filho vosso tem esta doença. Vocês vão continuar a agir assim, com ignorância?  Por favor não o façam! Não irá ajudar. Muito pelo contrario!  Tentem informar-se um pouco. Se não ajudam, não atrapalhem. (Sim, acreditem que pode atrapalhar muito na recuperação de alguém com anorexia). A anorexia é uma doença e deve ser tratada como tal. 

Vocês perguntam. Nós respondemos # 5

A semana passada não houve oportunidade de responder à nossa rubrica mas esta semana voltamos em força. Vamos então esclarecer a B que nos deixou a seguinte pergunta:

 

P: Gostaria de saber em que idade é que a doença se manifestou e a sua duração?

 

Catarina: No meu caso a doença manifestou-se aos quatorze anos de idade. Fui sempre perdendo peso durante o ano seguinte. Quando tinha quase dezasseis anos sofri um internamento de dois meses. Sai do hospital com um peso aceitável mas depressa o recomecei a perder. Cerca de meio ano mais tarde levantou-se a questão de um novo internamento e foi quando me convenci que tinha que lutar. Recomecei a recuperar até atingir o peso minimamente saudável. Mesmo assim ainda tive consultas durante mais dois anos. Claro que a regularidade das mesmas foi diminuindo até chegar ao dia em que tive a tão esperada alta, tinha dezoito anos.

Vânia: A anorexia esteve presente na minha vida mesmo sem nós percebermos. Desde pequena que não gostava de comer e não tinha fome... Mas a anorexia nervosa manifestou-se nos meus 15 anos, 16, talvez. Não sei ao certo a idade pois confesso que nunca fui muito de comer. Mas foi nessa altura em que passei só a comer a tal meia maçã de que já falei e perdi 20 kgs em muito pouco tempo.
Entre consultas e fases, pesagens, análises, soro, vitaminas e ameaças de internamento foram uns 5/6 anos. Não tive uma ''alta'' pois depois da anorexia fiquei com uma hérnia no hiatos e a má relação com a comida continuou, assim como as idas ao hospital levar soro. Não tive sorte nisso...
Penso que há uns 6 anos que posso dizer que estou bem.

Para a semana irão saber a resposta à pergunta da Filipa Iria, fiquem atentos.

 

Outras histórias...

Saiu um artigo no Expresso que nos foi somente um bocadinho familiar. Sim, "somente um bocado familiar" pois nenhuma de nós chegou ao ponto em que a protagonista desta história chegou.

Também a nossa querida Débora, do blog Heidiland, achou interessante esta matéria e lembrou-se de a partilhar conosco. Partilhamos convosco também (poderão ver a matéria completa em A anorexia tirou-lhe dez centímetros de altura. E muito mais.).

 

"Levados ao limite, os distúrbios alimentares matam. Tratados, são curáveis. No verão, as adolescentes expõem os corpos, comparam formas, tomam decisões. Algumas escolhem o caminho da privação alimentar. Desde 2010 realizaram-se 12.858 consultas e só em 2015 foram 47 os internamentos no Hospital de Santa Maria. Patrícia é um caso-limite. Há 25 anos sofre de anorexia nervosa. A doença provocou-lhe uma severa osteoporose e, quando estava a morrer, apenas nos Estados Unidos encontrou solução para lhe sustentar a coluna. Conta o que passou para que não se repita"

 

"Aos 34 anos, o peso mínimo que Patrícia chegou a ter foi 20 quilos. Pouco, para quem media 1,60 metros. O cérebro deixou de responder a contento e os órgãos começaram a falhar. Hoje, depois de vários internamentos e de uma complexa cirurgia nos Estados Unidos, Patrícia pesa 38 quilos e come para mudar um percurso de vida marcado por uma anorexia nervosa grave. Pelo caminho perdeu dez centímetros de altura e ganhou oito parafusos cromados na coluna. Escolheu morrer, mas foi-lhe dada a oportunidade de viver e por isso decidiu contar a sua história. Porque acredita que será possível ajudar outras jovens a evitar a privação alimentar severa.

 

1. NO INÍCIO, LAVAVA AS MÃOS

“Desde que sou gente que me recordo de ter uma relação especial com a comida. Lembro-me de estar sempre a lavar as mãos, até criar frieiras. Acho que comecei a fazê-lo com nove anos. Pensava que tudo o que entrasse no meu corpo tinha de ser puro. No fundo da minha memória há uma recordação de estar a mamar e não querer, sentir repugnância.”

Assim, num golpe, Patrícia explica como o distúrbio alimentar começou. Como se fosse indissociável da própria identidade. A doença foi-lhe diagnosticada aos 13 anos, quando passou a ser acompanhada psicologicamente. Tem 39 e é considerada pela equipa que a acompanha no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, como um dos casos mais graves que ali deram entrada. É um exemplo limite que serve para mostrar até onde a privação alimentar pode levar uma pessoa. A maior parte dos casos de anorexia nervosa que são tratados recuperam e apenas 30% se tornam crónicos (ver entrevista abaxo). É o caso de Patrícia. Nada no seu relato é ficcional.

 

2. LINHAS ARREDONDADAS NÃO

“Não gostei de ver os meus seios a crescer e as ancas a arredondar. Comecei a usar T-shirts em cima de T-shirts para esconder o corpo. Queria travar aquilo. Tinha medo. E não era de comida. Não sei do que era. Aos 13 anos fui fazer uma ecografia porque a minha menstruação não era regular e encaminharam-me para uma consulta psiquiátrica. Foi no verão e o médico recomendou o internamento. Na altura, eu estava sempre a pensar no que poderia fazer para não comer. Tinha muita fome, mas, mais importante do que me saciar, era encontrar uma forma de enganar as pessoas e não comer. Cheguei a pesar 27 quilos.”

Durante dois meses Patrícia esteve internada. No hospital, apenas outra jovem, então com 20 anos, lhe servia de espelho. Foi a primeira vez que conviveu com uma pessoa com anorexia. Alguém que conseguia ser ainda mais magra do que ela. Um dos passatempos era a comparação do diâmetro das coxas e a outra batia-a aos pontos porque tinha as pernas ainda mais estreitas. Em ambas, o mesmo sentimento de desconforto e inadaptação.

 

3. GANHAR PESO E AINDA SER MAGRA

“Entre os 15 e os 28 anos pesei cerca de 45 quilos e estava satisfeita porque ninguém me chateava e ainda diziam que era magra. Acabei o colégio, entrei para Arquitetura, fui estudante Erasmus em Paris, comia baguetes. De volta a Lisboa, comecei a trabalhar em cinema, à frente das câmaras, e parecia que finalmente me tinham dado uma vida para viver: a da personagem. Quando atuava não pensava em comida. Foi a altura em que me senti feliz no meu corpo. Mas o meu único irmão morreu de leucemia. Eu tinha 28 anos e ele tinha 31.”

Não comer foi a saída encontrada por Patrícia para lidar com a perda. Em causa já não estava o objetivo de ser magra, simplesmente não conseguia comer. O corpo dela estava programado para ter fome e no fim do curso pesava 32 quilos. Passaram-se seis anos de alimentação insuficiente, durante os quais foi perdendo peso, gordura, músculos. Tinha dores terríveis e ficou encurvada. Os órgãos estavam comprimidos, sem espaço para funcionar corretamente, sofria de diarreia. O pescoço não podia sustentar-lhe a cabeça. Patrícia não queria, mas, mesmo que quisesse, não conseguia alimentar-se. Aproximou-se do peso limite: 20 quilos.

 

4. RESPIRAR, SÓ NOS ESTADOS UNIDOS

“Aquela era a pior maneira de estar viva. Sofria de um achatamento intervertebral devido à osteoporose causada pelos muitos anos de anorexia. Estava disforme e custava-me respirar. Certo dia, enquanto fazia exercício, senti a coluna estalar e as vértebras ruir. Procurei ajuda na internet e um cirurgião respondeu-me do Hospital Monte Sinai, em Nova Iorque. Disse que me operava se eu pesasse 20 quilos. Tinha 34 anos e aqui em Portugal ninguém queria ajudar, diziam que não tinha peso suficiente para suportar a cirurgia. Estava a morrer. A operação nos Estados Unidos era muito cara, mas o meu pai, que sempre foi o meu pilar, já tinha perdido um filho e sabia que estava a perder a única filha que lhe restava. Vendemos a nossa casa em Lisboa. Era a minha vida ou a casa.”

A cirurgia de osteosíntese para juntar as vértebras da coluna com parafusos no Monte Sinai em 2012 custou cerca de 270 mil euros aos pais de Patrícia. Tiveram de se mudar para uma casa da família na zona da Covilhã. E foi ela quem tratou de tudo para partir. Além dos detalhes burocráticos, do envio de exames por e-mail, era preciso preparar a alimentação: saquinhos com cereais integrais e tofu. Em Nova Iorque, o neurocirurgião que a operou ficou tão impressionado com a situação que não hesitou em avançar, apesar dos riscos. No dia em que completou 35 anos, Patrícia foi operada.

 

5. NA CIDADE QUE NÃO DORME

“Quando cheguei ao hotel, parecia que todos olhavam para mim por ser tão magra. No hospital, nas vésperas da operação, os médicos mandaram-me comer tudo o que conseguisse, um conselho assustador para qualquer anorética. Eu pensava que não iria suportar a cirurgia e sentia-me tranquila por ir morrer. Estava à espera disso há muito tempo. Mas no dia a seguir à operação, acordei. Foi uma sorte. Agora quero viver. Nunca mais quero sentir a sensação de ter menos de 35 quilos, quando o meu cérebro não me responde. Quanto mais alimento dou ao meu corpo, menos anoreticamente eu penso.”

Patrícia partiu sozinha para Nova Iorque. Com ela, levava os seus 20 quilos e pequenos sacos com amêndoas secas. Ficou cerca de um mês. A recuperação foi dura porque tinha dificuldade em andar devido à falta de forças e o movimento fazia parte do tratamento. Os médicos insistiram, apoiaram-na. O corpo dela assemelhava-se ao de uma mulher com 80 anos. Depois da cirurgia, usava um colete plástico para alinhar a coluna e tinha uma grande cicatriz nas costas.

 

6. NADA É MAIS PERFEITO DO QUE O ZERO

“De regresso a Portugal, continuei a restringir a alimentação. E a fazer exercício. Como não consigo fazer muito mais, andava. Acordava de madrugada, saía descalça, no frio, e andava muito, subia escadas. Quando cheguei aos 22 quilos fui internada no Hospital da Covilhã e entubaram-me, alimentaram-me por sonda. Foi como se tivesse sido violada. Mas sobrevivi. Vim para Lisboa para novo internamento. Há dez anos que nada mais se passa na minha vida. Mas desta vez vai correr bem: finalmente fiz as pazes com a morte do meu irmão.”

Este ano, em Santa Maria, Patrícia não foi sedada. Medicada, sim. Os médicos administraram-lhe uma dieta hipercalórica. Hoje, quando se deita, os parafusos doem-lhe. Estão lá para ficar. Pesa 38 quilos e a meta são os 40. Sabe que se baixar novamente para os 20, morre. O corpo parou de se desmoronar, mas há um longo caminho a percorrer. Deixar de comer dá-lhe imenso prazer: “Ainda sou prisioneira, continuo a pensar que nada é mais perfeito do que o zero, que um corpo vazio está limpo e organizado. O meu corpo é o meu campo de batalha. 

Por: Christiana Martins

 

Nós as duas desejamos imensa força a esta guerreira. Nenhuma de nós passou pelo mesmo que ela mas ficamos solidárias e achamos de extrema importância mostrar no nosso blog a história da Patricia. 

Um beijinho na alma desta guerreira... e um nas vossas! 

 

A doença - Vânia

(Continuação daqui)

...e essa meia maçã começou a ser a única coisa que comia todos os dias por volta da hora de almoço. Quando o corpo me pedia mais alguma coisa, ou seja, quando eu me começava a ir abaixo, comprava uma fatia de salame- e não a comia toda. Mas isso apenas acontecia esporadicamente.

Emagreci muito. E em pouco tempo. Usava roupas largas já antes de emagrecer por isso era difícil de se perceber os quilos que já tinham sido perdidos.
Embora existisse sempre uma preocupação da minha mãe sobre as minhas refeições, eu mentia. Não tenho jeito para mentir. A sério que não! Sou daquelas pessoas que vão a meio da mentira e já se estão a rir feitas parvas. Mas nesta altura tornei-me numa mentirosa ''profissional''. Dizia que tinha comido bem na escola ou com os meus amigos de escolas diferentes (ela não sabia quem era por isso estava tranquila). Aos meus amigos dizia que tinha de comer em casa. Coisas do gênero. As mentiras iam saindo conforme os dias. Embora ache que a minha mãe começava a desconfiar pois as perguntas eram cada vez mais frequentes, penso que ela nunca esperou que chegasse ao ponto que cheguei. Até porque, há quase 15 anos, a anorexia não era tão conhecida como é agora e a maioria das pessoas nem sabiam o que isso era.
Um dia, ao entrar no duche, a minha mãe entrou na casa de banho e ficou preocupada. Segundo ela, ''dava para contar os ossos''.
Decidiu marcar consulta na médica de família. Foi aqui que fui diagnosticada, deveria ter 15 ou 16 anos, talvez. E seguiram-se tempos de consultas semanais, quinzenais e depois mensais. Entre pesagens, medições, análises, exames e vitaminas, as minhas notas baixaram e quis desistir da escola no meu 11ano mas a minha mãe não deixou. Nunca tive uma negativa, mas baixei imenso a média que tinha e isso desmoralizou-me. Desisti de dançar no rancho folclórico (adorava dançar e conhecer pessoas de todo o país) pois não tinha forças para longas viagens e para o meu fato que até era pesado. Apesar de desistir do rancho, continuei a participar em todos os torneios desportivos entre escolas mas o meu rendimento não era o mesmo. Chegava a ficar com tonturas e tinha de parar ou ser substituída. Algumas vezes fui até ao hospital com fraqueza ou até porque caia... claro, não tinha forças para aguentar as canetas!
Todos os dias a minha mãe e a minha avó me telefonavam nas refeições para garantir que comia alguma coisa. Chegaram a haver dias em que a minha avó me ligava a chorar e a implorar que comesse. E isso mexeu comigo! Também a minha prima (fomos quase sempre da mesma turma) e amigos começaram a acompanhar-me nos almoços mesmo que eu lhes tentasse dar a volta para que não o fizessem. Levavam-me aos meus sítios preferidos para garantir que comia alguma coisa. A minha mãe e avó cozinhavam sempre o que eu mais gostava!
Aos poucos fui começando a comer...
Porém, a escola acabou e, embora já comesse melhor, ganhei problemas no estômago. Tudo o que comia, vomitava. Andei assim um ano até ser correctamente medicada e o problema começar a ficar controlado. Foi uma das mazelas com que fiquei, entre muitas.
Em 2010 comecei a cozinhar e a ganhar gosto pela comida. Não sabia o que era gostar de comer ou ter fome, até aí!
E cá estou...

Vocês perguntam. Nós respondemos # 4

E voltamos mais uma vez com a nossa rubrica.

Desta vez, conforme o que dissemos anteriormente, é altura de responder á pergunta da nossa querida Kikas.

 

P: Olá queridas a minha pergunta é algo que já ouvi falar várias vezes: É verdade quando dizem que quem passa/teve uma anorexia ou anorexia nervosa, a mesma acompanha a pessoa o resto da vida? Ou seja, nunca se fica inteiramente curada/o da/s mazela/s?

 

Catarina: Não sei se todos os casos são iguais mas eu acho que a doença nunca me deixou. Sei que venci a doença mas, por vezes, sinto que ela está escondida nas sombras à espera que eu dê um paço em falso. acho que ganhei este medo durante o internamento. Conheci uma senhora que tinha estado doente em jovem e tinha-se curado. Depois aos quarenta separou-se e os problemas fizeram-na voltar para a doença. Esta história juntamente com outras vez-me perceber que a taxa de recaídas é bastante grande, o que me leva a ter receio. Nunca dei conta que estava doente o que é que me dá certezas que não posso ficar novamente sem me aperceber? A opção que tomei foi não me deixar intimidar por esta sombra que me segue e trabalhar diariamente para nunca a deixar voltar a tomar conta de mim.

 

Vânia: É uma pergunta que me deixa com algum medo pois soube de casos de recaídas já bastante tardios. Mas, não podemos pensar dessa forma.
A minha médica disse-me uma vez que a anorexia era para a vida. E acho que é. Até porque as mazelas ficaram e infelizmente são mais do que as que gostaria e que me atrapalham a vida de vez em quando... são tudo coisas que não irão voltar a ser o que eram.
Hoje em dia como de tudo (pelo menos quando o estômago deixa!) e às vezes até demais. Ganhei gosto pela comida, coisa que até há pouco tempo não conhecia. Sinceramente, não me vejo a conseguir voltar a deixar de comer como fiz. Porém, há dias em que me olho ao espelho e volto a não gostar do que vejo. Mas depois passa! Pelo menos, até agora tem passado. Sei que acontece a muitas mulheres, mesmo não tendo tido anorexia. Por isso, mais vale pensar que é só uma fase de mulher e que nada tem a ver com a doença.
Quando a minha avó faleceu, tive uma fase em que não conseguia comer. O mesmo aconteceu quando foi o meu avô e depois o meu padrinho. Mas voltei a mim, não podia fazer a minha família passar por isto outra vez. E acho que o facto de conseguirmos pensar também nos nossos e saber o que já se sofreu no passado que não nos deixa cair novamente

  

 

Obrigada, Kikas, pela pergunta. E na próxima rubrica contamos responder à nossa querida B♥.

Podem continuar a fazer as vossas perguntas pois vamos tentar dedicar um bocadinho de tempo a cada uma. :-)

Vocês perguntam. Nós respondemos # 3.

Bom dia. Hoje é dia de respondermos a mais uma pergunta. como já tínhamos dito na rubrica anterior vamos esclarecer a nossa linda only one girl

 

Pergunta: Ola! Eu gostava de saber quais é que são os sinais que tiveram no início da anorexia e como pode começar.
É preciso serem muito corajosas para falarem disto, beijinhos.

 

Catarina:Os sinais nem sempre são claros e variam um pouco de pessoa para pessoa mas existem alguns que devemos estar atentos. A perda excessiva de peso e em pouco tempo pode significar que algo não está bem. O isolamento, temos tendência a isolarmos-nos dos outros porque assim ninguém percebe que não comemos. A utilização de roupas largas de forma a esconder o corpo. Depois existem sinais mais marcantes mas que só conseguem ser vistos por pessoas mais próximas. É o caso da perda da menstruação e o facto de o corpo ficar coberto por uma pequena penugem tal como nos bebes. No meu caso passei também por uma fase de irritabilidade quando se falava de comer. O exercício físico excessivo e a incapacidade de estar parado muito tempo pode ser também uma sinal de doença. Por vezes desenvolvemos tiques como não parar de mexer as pernas mesmo estando deitadas porque assim estamos a queimar calorias.

 

Vânia: Obrigada, minha linda. Bem, os sinais,como já dissemos, não os vemos. Nós não! Convém os pais estarem atentos, principalmente na fase da adolescência pois é quando as nossas cabecinhas são mais frágeis. No meu caso, emagreci imenso em pouco tempo. Embora usa-se roupas bem largas (andava numa fase ''yo'' por isso era normal), um dia a minha mãe viu-me ir para o banho e diz que conseguia ''contar os ossos''. Sim, foi mesmo a expressão que ela usou!
''Fugia'' das refeições. Ou seja, aos meus pais dizia que comia na escola, na escola dizia que comia em casa... tinha sempre alguma desculpa a dar.
Claro que andava fraca e com tonturas, claro que o meu estômago já acusava sinais de não andar bem e comecei a ficar muito pálida e com olheiras bem negras -os olhos ''fundos'' (as velhas lá da aldeia diziam que eu andava metida nas drogas).
Basicamente, foi isso. Depois tive consequências com o tempo que passei em recuperação. Mas estas foram as principais que me levaram à médica e, consequentemente, ao diagnóstico.

 

Esperamos que as nossas respostas tenham servido para esclarecer o assunto. Para a semana vamos responder à pergunta da querida Kikas.

 

E como se juntam duas bloggers que não se conhecem?

Bem, este post é uma surpresa á nossa Catarina... uma espécie de homenagem á guerreira que ela é e que admiro imenso! 

 

Vamos começar pelo princípio, certo? Pois bem, ambas já interagiamos no blog pessoal de cada uma sem sabermos da história de vida uma da outra, já tínhamos criado até alguns laços com o tempo. Um dia, uma rapariga, a Goretti, pedia nos blogs que a ajudassemos na sua tese, contando problemas alimentares. Eu, que nem sou nada desbocada, partilhei um pouco da minha história e a Catarina comentou que também tinha passado pelo mesmo. Trocamos histórias de vida e foi assim que nasceu esta irmandade.

Pouquíssimo tempo depois, fui contactada pela rtp para ir contar a minha história. Como estava a terminar o meu estágio não podia estar a pedir dias para lá ir e achei que a Catarina seria perfeita para nos representar. Contei á pessoa,  contactei a Catarina (claro!) e ela acabou por ir. Foi super prestàvel, embora estivesse nervosa. E acham que haveria alguém melhor para nos representar que uma pessoa que passou pela doença e agora é uma mãe babadona destas? Não! A Catarina era perfeita para falar por nós. (E esteve tão bem.)

E assim foi. No fim, tanto ela como eu achamos que nos soube a pouco, que abordaram pouco o assunto e que este tema merecia ser mais divulgado. Foi assim que nasceu o desejo de criar este blog. Após uns meses a falar, de pesquisas, de muito trabalho na escolha do nome e de como iríamos fazer isto, foi criado este menino. E já lá vai quase um mês e com um feedback fantástico. Obrigada a todos por isso!

 

Bem, vamos ao que interessa. Isto será sobre a Catarina. É um agradecimento da minha parte a esta pessoa fantástica. E porquê? Porque a admiro imenso , não só por causa do seu passado e do seu presente mas por ser sempre uma pessoa disponível para tudo e que tem ideias fantásticas que eu não teria. É por ela que este blog acaba por ter mais vida.

Obrigada minha linda, não poderia ter conhecido uma ''irmã na doença'' mais atenciosa e simpática. 

 

 E agora, convido-vos a ver a nossa Catarina no programa "Agora Nós" a dar a voz por nós. Obrigada Catarina ( Ela esteve tão bem, não esteve???)

 

Cá está o link:

http://media.rtp.pt/blogs/agoranos/artigos/viver-com-anorexia_8288